terça-feira, 5 de maio de 2015

"Showman" dos animais é atacado por jacaré no Pantanal


Fabio Pellegrini - 04/05/15

03022015-rassmussenRichard Rasmussen em uma de suas cenas com animais
Campo Grande (MS) – O apresentador do programa "Mundo Selvagem" (canal NatGeo), Richard Rasmussen, teve um corte profundo em uma mão, causado por um jacaré há cerca de 15 dias, no Pantanal. A assessoria do programa não informou como o fato ocorreu, apenas que ele passa bem.
Richard estava com sua equipe em um hotel na localidade de Passo do Lontra, na Estrada Parque do Pantanal, no município de Corumbá, Mato Grosso do Sul. Após o acidente, ele foi encaminhado a um hospital em Campo Grande, a 315 km dali, onde teve o dedo suturado e retornou para casa, em São Paulo.
Em seu portal na internet "Aventuras do Richard", constam as informações de que Richard é brasileiro, formado em administração e biologia e fã de Charles Darwin. Desde criança gostava de acompanhar o avô materno em viagens pelo Centro-Oeste e Amazonas. Em sua casa mantém a produtora de video Txai e um criadouro conservacionista chamado "A Casa da Tartaruga".
Em 2005, conta a Folha de São Paulo, o Ibama embargou o criadouro e apreendeu cerca de 180 animais, incluindo primatas, aves e serpentes. O principal motivo para a cassação do registro de funcionamento foi a presença, no criadouro, de animais silvestres sem origem comprovada.
A equipe do Ibama autuou Richard em R$ 8.500 por encontrar animais sem a documentação legal necessária. Outras multas, de aproximadamente R$ 280 mil, já haviam sido aplicadas em 2002 pelo mesmo motivo.
Rasmussen é conhecido na tevê brasileira por seus programas em que manuseia animais silvestres livres, em áreas naturais, sem equipamentos de segurança, explanando sobre aspectos comportamentais e biológicos. Em determinadas situações, ele se atira de embarcações em movimento para agarrar jacarés; em outras, rasteja em busca de serpentes para pegá-las e até beijá-las.
A reportagem de ((o))eco apurou que há cerca de seis anos, Richard e sua equipe foram convidados a se retirar de uma pousada, também no Pantanal, por terem mantido um tamanduá-mirim preso no banheiro do quarto para gravação no dia seguinte, pois "não havia luz natural ideal para a filmagem". A informação é da gestora de turismo da empresa, que pediu para não ser identificada. A estratégia fora descoberta por uma camareira. Antes, outros funcionários do hotel haviam libertado um outro animal da mesma espécie que a equipe havia trancafiado em seu veículo.
Ana Paula Felicio, zootecnista da Gerência de Recursos Pesqueiros e Fauna do Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul (Imasul), conta que "repetidamente somos contatados pelos profissionais do programa solicitando imagens ou acompanhamento de ações 'simuladas' envolvendo manejo de fauna silvestre. Chamamos de simuladas essas ações, pois houve até um pedido para que disponibilizássemos um filhote de tamanduá para uma cena (havia até um roteiro para a tomada) na qual o animal seria resgatado de um incêndio florestal (que na verdade era um treinamento do Corpo de Bombeiros) onde o sr. Richard faria o resgate em meio às chamas, salvando o animal". Ela afirma que "este exemplo deixa claro o nível de comprometimento destes profissionais com as verdadeiras ações de informar e educar ambientalmente seus telespectadores".
Infração ou educação ambiental?
No Youtube há vários episódios dos programas em que Richard persegue e manipula animais silvestres. Em um deles, o apresentador salta de um barco para capturar uma sucuri (aos 9m16s) no barranco de um rio e a solta em um "lugar melhor", segundo ele.
Em outro, no Pantanal, Richard ensina um garoto a imobilizar um jacaré (aos 12m50s) para soltá-lo em "um lugar seguro e salvar a vida do animal".
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Para a zootecnista, "é possível enquadrar as ações promovidas pela equipe de filmagem e pelo Sr. Richard na Lei de Crimes Ambientais". A Lei de Crimes Ambientais (nº 9.605, de fevereiro de 1998), uma lei federal que prevê o seguinte nos artigos 29 e 32:
Art. 29. Matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida:
Pena - detenção de seis meses a um ano, e multa.
Art. 32. Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos:
Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.
§ 1º Incorre nas mesmas penas quem realiza experiência dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos.
§ 2º A pena é aumentada de um sexto a um terço, se ocorre morte do animal'
Opiniões de especialistas
O biólogo e fotógrafo de natureza Daniel De Granville afirma que, do ponto de vista de educação ambiental, não se pode sair correndo atrás de um animal silvestre para o manipular sem qualquer razão: "A impressão que tenho é que ele faz isso somente para se exibir, mostrar coragem ou domínio sobre o animal, um mau exemplo para os telespectadores. Muitos que o assistem não têm experiência com vida silvestre e acabam achando que isso é correto, correndo risco de sofrerem acidentes como aconteceu com o próprio, ou mesmo causar stress a um animal".
Do ponto de vista jurídico, Daniel questiona a permissão da produção do programa por parte de autoridades ambientais: "Sabemos que, para manipular animais silvestres no Brasil, é necessária uma licença oficial dos órgãos responsáveis, um processo complexo e burocrático. Então como é que esse apresentador está conseguindo essas licenças, e se está, qual a justificativa que ele tem? Mesmo com minhas qualificações, não me sinto no direito de sair por aí mexendo com animais de qualquer jeito, apenas para ter a luz ou o cenário adequados".
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Para o doutor em ecologia e especialista em comportamento animal José Sabino, professor da universidade Anhanguera-Uniderp, a intenção do programa de Richard é importante, mas falta refinamento profissional. "A sociedade brasileira conhece muito pouco nossa rica biodiversidade. Popularizá-la é fundamental. A crítica não é sobre o que ele faz, mas como ele faz. Ele expõe os animais de forma exagerada. Parece não haver gestão de riscos, o que o coloca em um patamar amador. O pior é que o programa incentiva pessoas sem qualquer qualificação ou treinamento a tentar fazer o mesmo, o que pode acabar mal."
O chefe de comunicação da Polícia Militar Ambiental de Mato Grosso do Sul (PMA-MS), major Ednilson Queiroz, explica que todo tipo de intervenção na fauna silvestre exige autorização prévia do órgão ambiental competente. "Em Mato Grosso do Sul, o Ibama acabou de passar esse poder para o Imasul. Sem a licença ambiental, os responsáveis podem responder nas três instâncias do Direito. No âmbito administrativo, as multas podem ser de R$ 500 a R$ 100 mil", diz.
O Ibama, por meio de sua assessoria de comunicação, informou que a equipe do programa só necessitaria de permissão se as filmagens fossem em alguma Unidade de Conservação de âmbito federal; e que a gestão de fauna é competência das autoridades ambientais estaduais.
O Setor de Fiscalização do Ibama informou que poderia autuar e multar Richard se caracterizados maus tratos aos animais, o que deve ser comprovado por laudo feito por profissional de medicina veterinária. Informou ainda que, caso alguém queira denunciar o programa, pode utilizar a Linha Verde do Ibama, pelo telefone 0800 61 8080.
A produção do programa foi contatada por internet e por telefone pela reportagem de ((o))eco mas não informou se possui licença dos órgãos competentes brasileiros para gravar os programas com animais silvestres. A reportagem tentou também ouvir o próprio Richard, mas não teve retorno.
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 Fonte: http://www.oeco.org.br/reportagens/29104-showman-dos-animais-e-atacado-por-jacare-no-pantanal

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