Foto: Adriano Gambarini
Pato-mergulhão, uma das dez espécies de aves aquáticas mais ameaçadas do mundo. Fotos: Adriano Gambarini
O cenário parece perfeito. Um imenso paredão de rocha acortina um rio de águas cristalinas. A mata ciliar acompanha suas margens protegidas, enquanto blocos de pedra formam agitadas corredeiras e grandes poços de água fria são povoados por milhares de ligeiros lambaris. Um casal de aves nada tranquilamente e se camufla à sombra da vegetação, esperando o tempo certo para mergulharem e se deliciarem na fartura de peixes. Há cerca de dois meses aconteceu o nascimento de filhotes desta que é uma das aves mais admiradas por ornitólogos e observadores de aves. Tudo corre bem nesta história, exceto pelo fato de que esta ave aquática é considerada uma das dez mais ameaçadas do mundo. Exigente por águas límpidas e cristalinas, luta para sobreviver num ambiente assolado por desmatamentos, assoreamento dos rios, expansão agropecuária e humana, detritos químicos e esgotos.
Foi neste contexto que o Instituto Terra Brasilis seguiu para região da Serra da Canastra, em Minas Gerais para pesquisar o raro pato-mergulhão (Mergus octosetaceus). Montou uma equipe permanente de biólogos em São Roque de Minas, dando início a uma série de atividades educativas e pesquisas com observação diária da espécie em campo. Buscou novos registros de distribuição do pato-mergulhão em diversos rios e tributários, tomou medidas estratégicas para conservar a espécie e estabeleceu propostas de recuperação de nascentes e mata ciliar com os proprietários rurais. Uma intenção audaciosa que começou em 2001 e desde então colheu muitos frutos, algumas pedras no meio do caminho (ou do rio), mas também muito conhecimento. Certamente um dos trabalhos mais incríveis realizados pela equipe começou há 8 anos, com a primeira captura do pato-mergulhão no mundo, para coleta de dados biométricos, colocação  de anilhas e radiotransmissores. Desta forma poderiam ter mais informações sobre a ecologia da espécie, dispersão dos filhotes, uso de território, formação de casais e uma série de dados importantes para sua conservação.
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  • Pesquisador do Instituto Terra Brasilis desce o Rio São Francisco em busca dos patos-mergulhão
“Há cerca de dois meses aconteceu o nascimento de filhotes desta que é uma das aves mais admiradas por ornitólogos e observadores de aves.”.
Há cerca de uma semana tive a oportunidade de fotografar pela terceira vez uma captura, atividade inserida no projeto “Pato Aqui, Água Acolá”, com patrocínio da Petrobras. Foram 7 dias de atividades no Rio São Francisco, próximo à famosa cachoeira Casca D’anta, no entorno do Parque Nacional da Serra da Canastra.
O trabalho consiste em localizar a família ou casal de patos de interesse, o que já não é tarefa nada fácil. Enquanto alguns membros da equipe seguem a pé ou de caiaque em busca visual, o resto se posiciona em lugares a jusante desta área, prontos para rapidamente instalarem as chamadas redes de neblina, próprias para captura de aves. Se os patos voarem em direção à rede e forem capturados, o que muitas vezes não acontece, começa a contagem regressiva para retirá-los  e dar início à biometria e análise das condições físicas do animal. Coleta de sangue é feita por um veterinário, enquanto diversas medições são realizadas pelos biólogos. A última etapa consiste em colocar anilhas coloridas e um radiotransmissor na cauda da ave.
O Instituto Terra Brasilis já realizou oito campanhas de captura totalizando cerca de 60 aves marcadas.  E justamente por conta desta marcação, descobriram, dentre outras informações, como as aves utilizam o território, para onde os jovens se dispersam, identificaram a formação de grupos mistos de jovens e conseguiram confirmar a reutilização de ninhos pelo mesmo casal ao longo de vários anos. Assim, conseguiram inclusive estimar a idade de alguns indivíduos. A partir desta pesquisa é possível estabelecer propostas para conservação e manejo da espécie, buscando garantir a qualidade do ecossistema e, sobretudo, da água.
Assista ao vídeo da soltura



Fonte: http://www.oeco.org.br/colunas/adriano-gambarini/o-arduo-caminho-para-proteger-o-pato-mergulhao/