quarta-feira, 3 de outubro de 2012

A míngua de peixes no antes fértil Paraíba do Sul

A sensação de paz em um passeio noturno pelo rio Paraíba do Sul é indescritível. A gasolina da pequena embarcação acabou e os remos foram nossos aliados na volta para a vila Beira Rio. Estou ao lado de Vladimir Ramos, 43, nascido e criado às margens do rio. "Meu pai me trazia desde pequeno para pescar aqui", conta. Ele nos guia rio acima sem o uso de lanternas. O Paraíba é a sua casa. Navegamos pela noite recolhendo as redes lançadas durante a tarde. A simplicidade de Vladimir tem a mais pura sincronia com o silêncio do rio. Descobrimos que lontras destroçado uma dezena de Curimbatás, uma das espécies que sustentam a pesca local, deixando apenas restos, que Vladimir não rejeita. Quando criança, diz, as pescarias diárias com seu pai rendiam entre 15 e 25 kg de peixes de espécies variadas. "Aquela época não volta mais, daqui para frente só vai piorar. Não tenho muitas esperanças". Poluentes despejados advindos de indústrias de Jacareí e São José dos Campo, cidades próximas à São Paulo, reduziram a biodiversidade do rio. “Na década de 40, quando meu pai era criança tinha até jacaré na várzea do rio”, diz Vladimir. Exageros de pescador à parte, a redução de peixes da última década transformou a vida da sua comunidade de pescadores. No final dos anos 90, Vladimir e seus irmãos mantinham uma barraca de peixes no mercado municipal que funcionava todos os dias da semana. Ela era abastecida pela família com a produção pesqueira diária feita no Paraíba. "A gente vendia uns 10 tipos de peixes, Curimbatá, Traíra, Tilápia, Mandi, Paiabanha, Bagre, Lambari. Pescávamos até 40kg por dia", diz Vladimir. Hoje, as pescarias individuais se limitam ao máximo de 5 kg. Boa parte dos pescadores mudou de atividades, foi trabalhar na construção civil. "Faço bicos como pedreiro e jardineiro. Mas o que gosto mesmo é pegar meu barquinho e sair rio abaixo", ouço de um morador da vila Beira Rio. A comunidade de pescadores está instalada no local há 40 anos. Hoje, tem 140 moradores que dizem se sentir parte de uma única e harmônica família. A prefeitura pretende removê-los, pois alega que eles representam um risco ambiental ao rio. Não é o que se vê. Os locais tentam até reciclar o lixo despejado no rio. Eles denunciam um despejo recorrente de esgoto, que viria da multinacional Monsanto. Manchas de óleo são comuns. Dona Antonia Ramos, 62, moradora mais antiga e líder local, teve alergias e irritações na pele após contato com a água contaminada. "No hospital ninguém explicou qual era a doença. Meu filho tomou água direta do rio neste mesmo dia e teve uma intoxicação terrível, quase morre", relata. Ela se diz testemunha da míngua crescente de peixes ao longo dos últimos 20 anos. A pesca é proibida por lei no período de desova, que ocorre entre o dia 15 de Novembro e 1 de Março. Pouco adianta, quase não há mais peixes. Fonte: O ECO - http://www.oeco.com.br/victor-moriyama/26515-a-mingua-de-peixes-do-antes-fertil-paraiba-do-sul

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