Um dos registros mais interessantes de uma serpente marinha foi feito por zoólogos da Zoological Society of London em 7 de dezembro de 1905, a cerca de 15 milhas (quase 28 km) da foz do rio Paraíba, no nordeste do Brasil. Edmund Meade-Waldo e Michael Nicoll estavam em uma expedição a bordo do Valhalla, quando viram uma grande nadadeira fora da água. Quando a embarcação se aproximou, a criatura ergueu um longo pescoço com uma cabeça “similar a uma tartaruga” que ondulava de forma peculiar conforme se movia rapidamente.
A avistagem foi publicada no volume de 1906 dos Proceedings of the Royal Society e no livro de Nicoll, publicado em 1908, Three Voyages of A Naturalist. Ninguém jamais identificou o que os dois viram, e sem evidência, além da descrição das testemunhas, nunca se saberá.
Partindo do princípio de que o registro não é uma piada - como a foto original do Monstro de Loch Ness -, a menos que uma criatura com as mesmas características seja fotografada, filmada ou apareça morta na praia o que temos é uma grande interrogação. Existem serpentes marinhas na costa do Brasil?
A possibilidade de que criaturas como a Grande Serpente Marinha, o Yeti, o Mapinguari, o Mokele Mbembee uma infinidade de outros estejam por aí é uma daquelas coisas que estimulam a imaginação e tornam o mundo mais interessante. Ficarei feliz se estiver errado, mas penso que não vamos encontrá-las. A chance de que realmente existam (ou tenham existido) depende de variáveis improváveis.
Entretanto, descobertas recentes mantêm acesa a chama de que outros bichos estão lá (“out there”) e serão confirmados um dia, descobertas tais como o Tubarão Megaboca, o Saola e uma espécie de mini-humano recentemente extinto, que talvez seja o Orang-pendek.
Serpentes de verdade
O legal é que serpentes marinhas existem. Um total de 57 espécies da subfamília Hydrophiinae, parentes próximos das najas e nossas cobras-coral, vivem nas águas tropicais do Indo-Pacífico, com um grande centro de diversidade no norte da Austrália, Nova Guiné e Indonésia.
A mais marinha de todas as serpentes é a Pelamis platura, que tive o prazer de encontrar na costa do Pacífico da Costa Rica. Trata-se de uma bela criatura de dorso negro, que a ajuda a se aquecer melhor quando boia na superfície. Seu ventre é amarelo-vivo e a cauda, lateralmente achatada, manchada de amarelo e negro - um provável alerta a predadores. Ao contrário das serpentes da lenda, é um bichinho colorido e simpático de meio metro, que chega a no máximo a 90 centímetros.
As serpentes terrestres têm o ventre coberto por uma única fileira de grandes escamas. Já as escamas da Pelamis são todas pequenas e o ventre não é achatado, mas forma uma quilha. Isso a torna incapaz de se locomover em terra, o que a leva a morte se encalhar na praia, pois não consegue voltar ao mar. Como golfinhos e baleias, a Pelamis (e a maioria de seus parentes) evoluiu de ancestrais terrestres, de uma forma que cortou o vínculo com a terra. Essa serpente totalmente pelágica vive ao sabor das correntes marinhas.
As adaptações à vida marinha impressionam. A Pelamis tem narinas que se ligam a uma traqueia extensível (serpentes não têm palato) e válvulas que impedem a entrada de água. Só têm um pulmão, que chega a quase o comprimento do corpo. Elas também conseguem respirar pela pele, o que satisfaz 25% das necessidades de oxigênio. Mamíferos marinhos, morram de inveja.
Outro superpoder é o seu veneno, um coquetel de neurotoxinas que mata e causa rigor mortis, facilitando a deglutição em segundos dos peixes que compõem sua dieta. Por isso, não é recomendável manusear esses bichos, embora não sejam nada agressivos. Por razão semelhante, elas não têm predadores. Os testados se recusam a comê-la por conta do provável gosto ruim.
Essas super adaptações tornaram a Pelamis o segundo réptil com maior distribuição geográfica no planeta. Só perdem para as tartarugas marinhas. Essas serpentes ocorrem da costa leste da África ao longo de todo o oceano Índico e do Pacífico até a costa da América, entre a Baja Califórnia e o norte do Peru, com bichos perdidos a norte e sul.
Apesar dessa abrangência, não colonizaram o Atlântico. As correntes frias no extremo sul da África e na costa sudoeste da América do Sul são uma barreira que a Pelamis nunca conseguiu ultrapassar.
Essa ausência do Atlântico também mostra que essas serpentes não estavam na costa americana quando o Istmo do Panamá se fechou, talvez tão cedo como há 22 milhões de anos atrás.
Seja lá o que Edmund Meade-Waldo e Michael Nicoll viram, não foi um primo gigante da Pelamis. A verdade está lá fora....
Fonte: http://www.oeco.com.br/olhar-naturalista/26909-historias-de-biologos-e-serpentes-marinhas-de-verdade
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