Esta obsessão pela genitália, seios, bundas, curvas, pelos e outras partes é evidente na arte desde a pré-história aos dias de hoje e no impressionante número de costumes entre diferentes culturas regulando sua exibição e ocultação. Um passeio na praia, uma olhada nas capas das revistas ou a um evento social mostram como a exibição explícita ou sutil de caracteres sexuais são importantes nas relações humanas.
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Os machos de muitas espécies de macacos africanos da subfamília Cercopithecinae mostram os típicos caracteres sexuais secundários da maioria dos primatas, como maior porte e corpos mais musculosos. Mas alguns vão um pouco mais longe e têm uma genitália brilhantemente colorida que é exibida sem pudor como parte da vida social destes bichos.
As seis espécies de macacos do gênero Chlorocebus (comumente chamados de vervets ou tantalus) são encontrados nas savanas e habitats mais ou menos florestados da África ao sul ao Saara, onde vivem em grupos centralizados, em um núcleo estável de fêmeas aparentadas organizadas em uma estrutura fortemente hierárquica (sim, algumas macacas são bem mais iguais que as outras), às quais se juntam um ou mais machos vindos de outros grupos. Como acontece com os babuínos, sobre os quais já escrevi.
Além das usuais flexões de músculos para atrair o interesse das fêmeas e intimidar rivais de mesmo sexo, estes machos também exibem seus escrotos de um azul claro brilhante e seus pênis de um vermelho vivo.
Observando estes macacos é comum ver que, enquanto o grupo procura alimento no chão e árvores próximas, o macho alfa do grupo está sentado de pernas abertas no alto de uma árvore ou arbusto, mostrando a todos o tamanho e cores de seu patrimônio, os quais são bons indicadores de sua saúde, força e qualidade genética, para intimidação dos manos e interesse das minas (o mesmo ocorre com outros sinais desse tipo em todo o reino animal).
O mais interessante é o espetáculo do conflito entre dois grupos de vervets ou tantalus que se encontram em fronteiras sob disputa. As forças adversárias gritam muito uma com a outra até os respectivos machos ficarem na linha de frente e, ameaçadoramente, exibirem as respectivas bolas azuis para os adversários, virando de costas, levantando a cauda e erguendo o traseiro para enfatizar seu ponto de vista. Esta guerra de gritos e impropérios sonoros e visuais prossegue até que uma das partes, impressionada pelas cores, som e tamanho da hoste adversária, bata em retirada. Em geral, sem que a violência se torne física.
Vivo em uma parte de São Paulo onde, infelizmente, o espetáculo da reunião de torcidas organizadas de times de futebol é frequente. E já testemunhei conflitos demais onde divergências sobre o desempenho de algo tão relevante como 22 hominídeos regiamente pagos correndo atrás de uma bola terminaram em violência e mortes.
Um desinteressado por futebol e fidelidades tribais como eu se sente um antropólogo em Marte ao tentar compreender este aspecto da cultura nacional, que dá importância gigantesca a algo irrelevante enquanto despreza o que é importante (gostaria de ver esse tipo de engajamento com relação ao lixo que é nosso ensino). Mas, pensando antropologicamente, o crônico show de violência e o conhecimento sobre como outros primatas se acertam me levam a fazer uma sugestão.
Seria muito mais civilizado se nossas torcidas organizadas seguissem o exemplo dos vervets e tantalus e resolvessem suas diferenças sobre quem é melhor de bola não com paus, bombas, pedras e tiros, mas através da competitiva e colorida exibição das suas partes íntimas, talvez tatuadas com as cores de suas tribos a fim de enfatizar a mensagem transmitida.
Seria menos violento e adicionaria um elemento pitoresco ao já colorido folclore do futebol brasileiro. Como acontece com as vervetas e tantalusas, talvez as minas até gostem.
Autor deste blog, Fabio Olmos é biólogo e doutor em zoologia. Tem um pendor pela ornitologia e gosto pela relação entre ecologia, economia e antropologia. Seu último livro, sobre ecossistemas brasileiros e conservação, éEspécies e Ecossistemas. |
Fonte: http://www.oeco.org.br/olhar-naturalista/27204-a-guerra-das-bolas-azuis
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